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Depois em Seguida

CULTURA | MUNDO | ENTREVISTAS | OPINIÃO

06 de Fevereiro, 2021

ANA CRISTINA DIAS

Ana Cristina Dias nasceu em Lisboa e é licenciada em Pintura. É uma pintora que explora a beleza da natureza e a sua consciência, estimulando os nossos sentidos e sonhos.

A forma como “manifesta as suas paixões e as suas inquietações” através da pintura é uma verdadeira inspiração. 

O trabalho da artista faz-me lembrar o poema Cage Bird de Maya Angelou (1928 – 2014):

«Um pássaro livre

salta para as costas do vento   

e flutua ao sabor da corrente até esta acabar,

mergulhando o seu voo nos raios

do sol laranja

e atrevendo-se a reclamar o céu.»

 

Na entrevista, a pintura Ana Cristina Dias, fala-nos das suas poesias e da sua vida enquanto artista.

P03_2830a.jpg©José Calheiros

DES: Em que medida é que a sensibilidade é importante no processo criativo?

Ana Cristina Dias: De imediato, eu diria que sem a sensibilidade no processo criativo - à partida - a obra estaria condenada ao insucesso. Se a sensibilidade é a nossa capacidade de reagir aos estímulos, se o estímulo não for suficientemente forte para nos emocionar o processo criativo poderá nunca passar de uma ideia que ficou num bloco de notas. Talvez a sensibilidade esteja na verdade, sermos fiéis a nós mesmos e não a flashes exteriores que nos vão beliscando sem fazer doer.

 

 DES: Preferes a ideia ou a concretização? Ou deixas acontecer?

Ana Cristina Dias: Por costume faço sempre um planeamento, seja das minhas rotinas diárias ou no meu trabalho de pintura, as poucas vezes que deixei acontecer o resultado foi sempre trabalho para o lixo. Tenho um prazer muito grande no processo de execução, ver a ideia a ganhar forma, a ideia é essencial, sem ela é como se estivéssemos no alto-mar num barco sem remos.

 

DES: Qual o trabalho que mais gostaste de fazer até hoje? Porquê?

Ana Cristina Dias: Um mural em Alfama. Trabalho muito simples, o resultado foi muito gratificante. Sinto que com esse trabalho cheguei a muitas pessoas e que consegui passar a mensagem.

 

DES: O que consideras um trabalho irreverente na pintura?

Ana Cristina Dias: Um trabalho que se destaca pela diferença, que tenta quebrar regras estabelecidas, um trabalho ousado, que nos salta à vista ou porque o tema é delicado ou excessivamente forte. Ou pela forma como o artista deu corpo e tratou o tema. Se eu estiver diante de duas obras, uma que considero irreverente e outra um clichê, aquela que mais vou dedicar o meu tempo a apreciar é sem dúvida aquela que mais me sensibiliza. Eu posso me comover com uma jarra com flores, desde que a sua beleza me chegue ao coração e a técnica me arregale os olhos.

 

DES: O que mais te inspira no outro e porquê?

Ana Cristina Dias: Altruísmo, porque me comove.

43219214_1718496744926726_2515399316898578432_o (2©ACD

DES: Em termos de mecenato na Cultura, como vês a realidade actual?
Ana Cristina Dias:  Há muito pouca protecção dispensada às artes, sinto que estou a fazer uma longa travessia em autonomia, para o bem e para o mal.

 

DES: Qual foi a maior aventura  que te aconteceu num dia de exposição?
Ana Cristina Dias: Até hoje nada de diferente para contar.

 

DES: Qual foi a coisa que te disseram sobre o teu trabalho que mais te marcou até hoje?

Ana Cristina Dias:  Na generalidade tenho recebido palavras de incentivo, essencialmente palavras que me fazem acreditar que este é o meu caminho. Há uns anos  alguém  escreveu algo sobre um trabalho meu que  ficou na memória, ainda não sei se foi um elogio ou não, soou mal mas,  tenho a meu favor uma boa capacidade de desconstrução... "este quadro é uma paulada na Rego", provavelmente incomodou-me a palavra "paulada" porque me considero um ser apaziguador.

 

DES: O que gostavas de fazer que ainda não tiveste oportunidade de concretizar? 

Ana Cristina Dias: Pôr a mochila às costas e só com o essencial. Levar no bolso uns trocos para o essencial e partir rumo a lugares longes dos grandes centros, Argentina, Peru, Colômbia.

mural2.jpg©ACD

DES: Como vês o futuro da pintura, ilustração?

Ana Cristina Dias: Estamos a viver a altura Covid-19, enquanto pinto costumo ouvir rádio e é assustadora a previsão da crise financeira.  Gostaria de ter uma perspectiva mais optimista mas, seria muito naïf se o fizesse. A arte alimenta a alma, mas numa altura em que as pessoas estão mais preocupadas em alimentar a barriga, as perspectivas não são cor de rosa. À parte deste contexto que estamos a passar acho que as pessoas começam a estar mais presentes nos eventos e mais interessadas no que se vai fazendo. A net e as redes sociais deram um excelente contributo para desmistificar a ideia que a arte só era acessível a um grupo de pessoas.

 

DES: Há alguma coisa de que te arrependas muito?

Ana Cristina Dias: Sim, quando acabei o curso de pintura devia-me ter dedicado só a pintar e aproveitar a condição de filha sustentada pelo pai. Mas o desejo de ganhar o próprio dinheiro falou mais alto e durante muito tempo mantive-me longe da pintura, pergunto-me muitas vezes o que teria ganho com isso.

 

DES: Como ocupas os teus tempos livres?

Ana Cristina Dias: A fotografar, caminhar na natureza, apreciar pormenores da natureza, observar e ouvir os pássaros. Longos passeios por Lisboa, exercício físico (sou dependente), visitar museus, deveria dedicar-me mais à leitura que é uma boa ajuda no processo criativo.

 

DES: E o amor. O que é o amor?

Ana Cristina Dias: O que é o amor? É andar de mãos dadas em silêncio.

 

DES: Obrigado, Ana.