Caroline Rocha
Por Amaro Figueiredo
A Caroline Rocha é luso-francesa e criadora de filtros para o Instagram e para o Facebook. São mais de 56 mil criadores de filtros no mundo inteiro. Transforma o mal e o sofrimento em algo bonito e alegre. Autodidata, gosta de fotografia, da família, de cantar e é cinéfila ferrenha: no fundo é amor.
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DES: Diz-me duas vantagens e uma desvantagem dos filtros que usamos nas redes sociais?
Caroline R.: Uma das vantagens é poder interagir com algo inexistente no mundo real, em tempo real e sem sair de casa. Poder experimentar uma roupa, ver-se num mundo de fantasia, vestir uma peça de joalharia excêntrica, enfim (pausa) as opções são infinitas. Psicologicamente o filtro joga muito sobre a necessidade de apropriação e de controlo. E pela minha experiência e de outros, tenho vindo a reparar que dá um sentimento de confiança e de estabilidade. A face oculta da realidade aumentada nos filtros está relacionada com a beleza e com a imagem. Milhares de filtros são criados para esse efeito. Ter uma pele perfeita, uns lábios maiores. Criou um monstro, pois a tendência de uso desse tipo de filtro é extremamente «addictive» e os usuários acabam por convencer-se que são a imagem refletida no seu telemóvel. O resultado é que a interação social evita-se, pois a verdade não quer ser revelada. A tendência «barbie face» está a embutir insegurança nos jovens! Mas posso dizer que o Facebook tem proibido os filtros com deformação a efeitos cirurgia plástica para ir contra a tendência, o que eu acho notório.
DES: Como percebeste que querias estar ligada à criação digital?
Caroline R.: Vou ser sincera, nunca estive ligada ao mundo digital. Fui submersa pelo mundo digital devido à minha saúde. Percebi que queria estar ligada quando os meus seguidores Instagram contavam-me as suas próprias historias. Miúdos que sofriam de depressão, de bullying, de todo o tipo de opressão psicológica, e outros sendo incapazes de sair das suas próprias camas por estarem paralisados. São esses miúdos que me dizem «obrigada por iluminar o meu dia». Sinto uma grande responsabilidade para com esses miúdos e devo-lhes essa atenção. Daí ter decidido avançar e passar mensagens de amor através do meu trabalho.
DES: Onde tens as melhores ideias?
Caroline R.: As melhores ideias vêm das pessoas que me tocam e do ridículo que a sociedade quer impor. Tento tornar o mal e o sofrimento em algo bonito e alegre.
DES: Preferes a ideia ou a concretização?
Caroline R.: Prefiro a concretização, exige mais de nós, exige dar de si. A ideia chega, muda e pode desaparecer, nunca deixa ser igual. A concretização fica.
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DES: Como vês o futuro das redes sociais?
Caroline R.: O futuro das redes sociais... será sempre um óptimo meio de comunicação e uma óptima plataforma para a promoção. Eu sendo uma filha dos anos 80, tive a sorte de viver numa época onde as pessoas se esforçavam para tudo. Para estarem juntas, para mostrarem-se tal como são (pausa) o que se chama «viver». O viver de hoje reduz-se a fotos postas em redes sociais que relatam um momento efémero.
DES: Tens o sonho de te lançares em novos projectos?
Caroline R.: Tenho alguns projectos, a maioria relacionada com a realidade aumentada. Quero trazer todas as artes às pessoas, que possam interagir e não ficar só a olhar. Usar essa tecnologia para poder promover artistas. E se houver interação com o trabalho do artista mais aproximação haverá. E digo isso porque os artistas são vistos como «inacessíveis». E quem não quer identificar-se com o artista? Procuramos sempre o porquê. «O que será que estava a pensar quando decidiu pintar esse quadro? », «o que lhe terá acontecido depois de ter tirado essa foto?» Podemos responder a muitas perguntas dessas com a realidade aumentada, é só interagir.
DES: O que gostavas de fazer que ainda não tiveste oportunidade de concretizar?
Caroline R.: Sempre fui muito ambiciosa (pausa) confesso que já fiz tudo o que queria fazer. Atingi todos os meus objectivos.Hoje quero dedicar-me aos que me rodeiam, dar o que eu ganhei, dar esperança, dar vida, dar amor. Num mundo onde todos se fecham, quero quebrar barreiras e abraçar.
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DES: Há alguma coisa de que te arrependas muito?
Caroline R.: Arrependo-me de ter deixado o meu país, França. Deixei lá tudo. Os meus amigos, uma carreira promissora. (pausa) Mas essas amizades mantêm-se e a carreira não é tudo.Tenho cá a minha família, as minhas pessoas e não me posso queixar do meu actual trabalho.Tento sempre ver o bem quando tudo se torna difícil...
DES: O esquecimento é o maior descuido humano? Há falta da verdade?
Caroline R.: Se o cérebro necessita apagar informações relevantes para conseguir concentrar-se em coisas realmente relevantes então que seja! Há falta de verdade sim. O medo tomou conta de tudo. Estamos a viver numa era sensível, onde se tem que ter cuidado com as palavras, na postura, no ser. De asas cortadas avançamos nesse corredor escuro que nos anula.
DES: Como ocupas os teus tempos livres?
Caroline R.: Ocupo o meu tempo livre com a minha família, com os que amo. Ou quando não é o caso, crio conteúdo, vídeos, fotografia, canto.Também sou cinéfila ferrenha.
DES: Vamos fazer um jogo. Eu digo uma palavra e tu dizes o que vier à memória. Amor…
Caroline R.: Vida.
DES: Saudade...
Caroline R.: Procura
DES: Pele...
Caroline R.: Necessidade.
DES: Sociedade...
Caroline R.: Molde.
DES: Medo...
Caroline R.: Humano.
DES: Joker...
Caroline R.: Opressão.